04/11/2024

Visita ao Museu do Aljube - Resistência e Liberdade



Quem no passado dia 31 de outubro “penou” para subir as ingremes ruas de Alfama para chegar ao Museu, certamente, não padeceu tanto quanto os cerca de 30.000 presos políticos sofreram naquelas salas de angústia, tortura física e psicológica.

O Museu do Aljube - da Resistência e Liberdade, comumente conhecido por Museu do Aljube, está instalado na antiga Cadeia do Aljube, em Alfama e foi inaugurado no dia 25 de abril de 2015.

Era uma cadeia destinada, durante o Estado Novo, a encarcerar, temporariamente, os presos
políticos opositores ao regime salazarista. Aqui aguardavam, com a maior angústia, a chamada para a “António Maria Cardoso”, sede da PIDE onde iriam ser interrogados, ou daí regressavam para conhecer qual o seu destino, ou melhor dizendo, para qual das prisões iriam ser encaminhados.

O Museu, para a sua “construção” aproveitou a estrutura do edifício e remodelou algumas salas, revestindo as paredes com uma prolífera descrição textual e iconográfica das várias épocas, desde a 1ª República ao 25 de Abril. Da organização original mantiveram-se uma meia dúzia de “curros” ou “gavetas”. Estes, eram assim designados pelos presos, por serem de dimensão idêntica às instalações reservadas aos os touros antes das corridas: 2 metros de comprimento por um de largura. Muito exíguos para um ser humano que aí era mantido durante semanas ou meses a fio, com uma luz exígua e sem comunicação com os outros prisioneiros. Havia 14 celas de isolamento, além de outras celas coletivas.

Emocionantes são as descrições feitas por alguns presos das torturas a que foram sujeitos:
desde a tortura de estátua, a gota de água, o isolamento contínuo, etc. Todo o museu está impregnado de uma enorme carga dramática.


Certamente ficou na memória auditiva de todos nós o som da campainha do telefone, que na altura servia de aviso para que um dos presos fosse conduzido à sede da PIDE para interrogatório, e muito provavelmente para ser sujeito à tortura necessária para obter a confissão, ou a sua transferência para outra cadeia, o que provocava uma enorme angústia aos detidos.

Por lá passaram homens (não consta que lá tenham sido encarceradas mulheres)
de grande coragem, resistência e capacidade de sofrimento em defesa dos seus ideais. Não referiremos nomes, pois a sua lista é infindável e todos mereceriam ser citados. As fotos das fichas da prisão apresentadas num painel ilustram o elevado número de prisioneiros.

O Museu faz também uma viagem por outras prisões do então “Império Colonial Português”, mostrando as cadeias de Cabo Verde “Tarrafal”, Guiné, S. Tomé, Angola, Moçambique, Goa Damão e Dio e Timor e ainda, no continente as de Peniche, Trafaria, Caxias.

Uma das salas transporta-nos numa viagem iconográfica que ilustra o decorrer da História desde o início da 1ª República, o início da prisão até aos tempos mais recentes, passando pelo Estado Novo, o período colonialista, os movimentos de libertação das “províncias ultramarinas”, a “era da abertura marcelista”, o 25 de abril, terminando com imagens da Assembleia Constituinte.

Algumas reportagens televisivas são apresentadas como
testemunho do poder, tais como o “famoso” discurso de Salazar em Braga, em 28 de maio de 1936, no qual afirma “não discutimos Deus, não discutimos a pátria, não discutimos a família, não discutimos a autoridade e não discutimos o trabalho”, e ainda alguns depoimentos de ex-prisioneiros, como testemunho da resistência: Camilo Mortágua Domingos Abrantes, de entre tantos outros.

Também podemos observar alguns exemplares de documentos censurados pelo “lápis azul” e ainda algumas normas emitidas pela PIDE, emanando diretrizes para os noticiários, ou punindo quem prevaricou, publicando “o que não devia”, como foi o caso do Diretor do Jornal República, o qual foi punido com 3 dias de suspensão. 

Foi possível observar a reconstituição do equipamento e instalações de impressão de panfletos e jornais que eram publicados pelos núcleos de resistência e divulgados, sempre de forma clandestina e com risco da própria vida.     

A visita termina com uma sala dedicada ao 25 de abril e uma frase emblemática que nos ajuda a não esquecer o passado e nos encaminha para o futuro, ainda que incerto, pelo menos melhor que o passado, “Sem memória não há futuro”.




Zacarias Dias

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