A caminho de Santo Isidro de Pegões
Às 8 horas, prontos para a partida, junto à estação dos caminhos-de-ferro.
Do programa:
Igreja de Santo Isidro de Pegões e conjunto arquitectónico envolvente; visita ao Núcleo de Figueiras; Museu Agrícola da Atalaia; pausa para almoço; Quinta do Saldanha e ermida de Santo António; Pátio d'Água e Ermida de Santo António; Moinho de Maré; chegada a Torres Vedras - 20 h 00.
Antes da partida, digo aos meus botões: «Já vi aquela igreja! Mas, não me lembro de nada. É como se tivesse sonhado.» Chegamos a Santo Isidro de Pegões. Vi? 1 Esta, foi uma ideia que acrescentou magia ao interesse pela visita organizada pela Oficina da Fotografia, disciplina da AUTITV – Universidade Sénior de Torres Vedras. Como de costume, foi-nos distribuído um caderninho que vale a pena de coleccionar e pode ser consultado na biblioteca da AUTITV, com síntese sobre todos os pontos do programa, acompanhada de imagens.
A Colónia Agrícola de Pegões foi constituída a partir da Herdade de Pegões, de 7000 hectares, propriedade de José Rovisco Pais, numa área de 4767,5 hectares, por doação aos Hospitais Civis de Lisboa. José Rovisco Pais tinha feito uma tentativa de colonização, a exemplo da de José Maria Santos na segunda metade do século XIX, na Herdade de Rio Frio, Pinhal Novo, perto de Pegões Velhos.
No caso das Colónias Agrícolas da Junta de Colonização Interna, o Estado poderia ter expropriado parcelas em determinadas situações, e em certos casos promoveu obras de irrigação de terrenos que beneficiaram os proprietários, mas perante as resistências destes, tal nunca chegou a acontecer. Em Pegões o problema não se punha, por as terras pertencerem ao Estado.
A Colónia Agrícola de Santo Isidro de Pegões tinha três núcleos, o de Pegões Velhos, o de Figueiras e o de Faias. A parte que é farol do conjunto é a da igreja e seu entorno. A igreja, com adro sobrelevado, centro de tudo. Da sua porta, olha-se em frente para a Avenida de Santo Isidro; a pouca distância, de um lado e de outro, uma escola primária, as raparigas, para uma parte e os rapazes para a outra, fazendo um ângulo, em relação à artéria, de aproximadamente 30 graus. Há ainda a acrescentar nesta zona as habitações das professoras (duas) e a do padre. As professoras eram nomeadas pelo Ministério da Agricultura.
Situada numa ampla plataforma elevada relativamente às restantes construções que compõem o conjunto, o edifício da igreja representa inequivocamente o momento mais insinuado do desenho de Eugénio Correia. Esta ideia sobranceira demonstra prontamente o seu carácter simbólico de ponto de referência naquele lugar, havendo contudo uma consciência de que a sua elevação espiritual carece da devida ligação ao mundo. Dessa forma a porção de terreno compreendida entre a estrada e a igreja não se assume enquanto um domínio artificializado, sendo antes um modo de efectivar naturalmente a ligação entre esses dois momentos. (Santo Isidro de Pegões: Contrastes de Um Património a Preservar, do capítulo III, O NÚCLEO DE EDIFÍCIOS MODERNOS DE SANTO ISIDRO DE PEGÕES, por Hélder Paiva Coelho, pág. 102.)
A igreja, as escolas e as três habitações são o conjunto inspirado no Movimento Moderno, miscigenado «com as influências brasileiras», contrariando «a arquitectura rectilínea que então predominava», nas palavras de Óscar Niemeyer.
A forma parabolóide (tornada possível pelo uso do betão armado, em que «paredes e cobertura constituem uma superfície contínua»2) e os fusos cerâmicos são marca distintiva no núcleo moderno de S. Isidro de Pegões.
O que torna mais marcantes os edifícios de Pegões é a sua forma parabolóide, que lhes confere um carácter radicalmente moderno, na qual paredes e cobertura constituem uma superfície contínua – em contraste com as formas de construção tradicionais. (Santo Isidro de Pegões: Contrastes de Um Património a Preservar, do capítulo II, CARACTERIZAÇÃO DAS CONSTRUÇÕES À BASE DE FUSOS CERÂMICOS, por Nuno Teotónio Pereira, pág. 38.)
Os fusos cerâmicos (30 cm de comprimento e 8 cm de diâmetro exterior), na forma de uma garrafa, sem fundo e com gargalo, encaixavam uns nos outros, semelhando caules de bambu. São de barro, flexíveis, resistentes e com propriedades térmicas.
A sua isotermia é considerável. Com efeito, a forma própria do fuso tende a acelerar todo o movimento de fluido que esteja nos eu interior e, como tais movimentos são produzidos sempre pelas diferenças e temperatura nas diversas partes do tubo que forma o conjunto de fusos, o ar que este contém põe-se em movimento impedindo a acumulação de calor em qualquer parte. (… do cap. II, por Nuno Teotónio Pereira…, pág. 48.)
Foram criadas sete colónias agrícolas, a maioria no Norte e Centro do País, sendo a de Pegões, a única ao sul do Tejo, a maior e que mantém um conjunto de estruturas e continuidade de habitações e estrutura viária, aproveitando as linhas de água ou ribeiros, com o essencial de marcas identitárias do passado. Muita coisa mudou. A Junta de Colonização Interna foi extinta em Outubro de 1974; os colonos (marido e mulher), primeiro com contrato de fruição provisória, de 3 a 5 anos, depois, definitiva, passando, por morte, a titularidade para o filho mais velho, conseguiram nos finais dos anos oitenta ter a posse plena das suas casas e terras. Mas, a memória da colónia está viva. Complete com a resenha histórica de Santo Isidro de Pegões: https://www.mun-montijo.pt/municipio/freguesias/uniao-das-freguesias-de-pegoes - faq-0
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Fizemos o percurso a pé pela Avenida 25 de Abril, mirando tudo, incluindo algumas adaptações nas casas de habitação, até à Cooperativa Agrícola de Santo Isidro de Pegões, tendo visitado ali ao lado a Adega de Vinhos, de onde alguns de nós trouxemos uma garrafa para recordação. Uma Avenida perpendicular à de Santo Isidro mantém o nome de Rovisco Pais, onde está situada a delegação da Junta de Freguesia. Passamos, ainda, pelo Núcleo de Figueiras. Segue-se a pausa para almoço nas Lançadas, freguesia de Sarilhos Grandes. Na Casa das Lamejinhas espera-nos o Ensopado de Enguias e mais três pratos, previamente combinados pela organização da visita, conforme escolha de cada um dos visitantes. Momento importante de confraternização, bem como o convívio e conhecimento com a companhia que nos vai cabendo no assento do lado, durante a viagem. Tenho sido particularmente feliz nas últimas três ou quatro visitas de estudo.
Da parte da tarde, estivemos no Museu Agrícola da Atalaia, onde, além dos objectos e maquinaria agrícola, vemos logo à entrada informação sobre a Festa Grande da Senhora da Atalaia, com círios das localidades vizinhas. O Círio da Alfândega de Lisboa celebrou em 2007 500 anos de peregrinação ao Santuário.
Alguma coisa do programa deixamos de falar, do que fomos sendo informados pela organização da visita. De dentro do autocarro, apreciamos o monumento das Portas da Cidade, a Casa-Museu de Jorge Peixinho…
Finalmente, o Cais do Moinho de Maré ou Cais das Faluas. A Dr.a Fernanda, que nos acompanhou desde a igreja de Santo Isidro, também, aqui, explicou pormenorizadamente o funcionamento do moinho, com histórias sobre o último moleiro. No fim de tudo, um momento de convívio, com oferta de um cálice, bebido em ambiente de alegria, acompanhado de um bolinho e dois exemplares para a biblioteca da AUTITV do livro Santo Isidro de Pegões: Contrastes de Um Património a Preservar, de Nuno Teotónio Pereira, Hélder Paiva Coelho, Isabel Costa Lopes e Irene Buarque, Edições Colibri – Câmara Municipal de Montijo, 2009.
E fotografia de grupo.
P. S. Quero lembrar, também a Senhora Professora D.a Inocência, filha de um dos colonos instalado em 1961 (tinha onze anos nesta data), pelas explicações prestadas na igreja sobre a sua experiência da vida em Santo Isidro de Pegões. Com a família, veio também o tio, Padre Penha, colocado na paróquia pouco antes. D.ª Inocência foi professora numa das escolas de Santo Isidro de Pegões. Jovial… Ambas, Fernanda e Inocência, nos receberam com muito carinho.
https://www.rtp.pt/play/p5656/e401418/visita-guiada (Não perca este episódio e venha conhecer a antiga Colónia de Santo Isidro de Pegões, antes e depois do 25 de Abril.)
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1 Não me lembro de ter ido à Colónia Agrícola de Pegões, mas tenho ideia convicta de já ter visto a igreja, situada perto de Vendas Novas. Falo disto à Rosário e diz:
– Nós fomos lá…, levados pelo Domingos, marido da Alda. Fomos recebidos em casa dos pais, que estavam presentes, mais a avó. À noite, depois das aulas… A senhora de idade, devia ser avó. A casa era à beira da estrada, da cozinha dava para o quintal. Tinha um «pinguinhas», um Citröen 2 CV, bege. O Domingos dava aulas na Escola Secundária, como a Alda.
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De memória, lembro que o Domingos Mota disse que o pai explorava dez hectares, possivelmente mais… Tínhamos alunos de Pegões, das Taipadas, de Canha, Cabrela..., além de Vendas Novas.
Os colonos em 80/81, 81/82 ainda não tinham conseguido obter a posse plena das suas fracções, o que só veio a acontecer nos finais dessa década (1988).
Quanto à visita, tive um apagão…, quase total, restando apenas uma nuvem sonhada em forma de igreja.
2 Nuno Teotónio Pereira, no capítulo II de Santo Isidro de Pegões: Contrastes de Um Património a Preservar…, Edições Colibri – Câmara Municipal de Montijo, 2009, p. 38.
Mapa do concelho do Montijo, partes Este e Oeste (exclave)
A Junta de Freguesia de Santo Isidro de Pegões, inaugurada em 1957, e a Junta de Freguesia de Pegões foram agregadas, pela Lei n.º 11-A / 2013, de 28 de Janeiro, passando a formar a União de Freguesias de Pegões, com sede em Pegões. Em Santo Isidro de Pegões há delegação da Junta na Avenida Rovisco Pais.
A igreja de Santo Isidro
À esquerda, vê-se parte do baptistério, à direita, a sacristia
Aqui, predomina a linha curva parabólica, característica, também, das casas das professoras e do padre. À esquerda, vê-se parte do baptistério e, à direita, da sacristia.
A Dr.ª Fernanda acompanhou-nos, até ao fim da visita, no Moinho de Maré, partilhando o seu saber, pormenorizadamente...
Uma das duas escolas primárias
«(...) solos arenosos em plena mancha pliocénica do sul do Tejo»
Estes solos têm abundância de águas, veios aquíferos.
O pliocénico é a época mais recente do período neogénico, vai só de há cerca de 5,33 a cerca de 2,58 milhões de anos, antes do tempo presente. Vivemos actualmente já noutro período, época pleistocénica, que segundo a etimologia grega significa de génese (ainda) mais recente. Começou há cerca de 2,58 milhões de anos. Coisa pouca, comparando com o período mais antigo, Sideriana (da era paleoproterozóica, do éon proterozóico). O período Sideriana vai de cerca de 2500 a 2300 milhões de anos, antes do tempo presente. De 2500 milhões até ao fundo dos tempos!!!..., mudez, mistério total. (Ver wikipédia, períodos geológicos).
Continuando no caminho, à vista da Cooperativa Agrícola de Pegões e Adega de Vinhos
Painel, como pórtico de entrada no pavilhão grande
Actividades Agrícolas na Quinta Nova da Atalaia.
Entre o último sábado de Agosto e a segunda-feira seguinte, destaque para A Festa Grande da Senhora da Atalaia.
A Festa Grande da Senhora da Atalaia
Esmagador
Aqui chega a presença da Casa Hipólito, grande empresa metalomecânica ligeira de Torres Vedras, criada por António Hipólito (1882-1954), um dos três «latoeiros prodigiosos de Torres Vedras», como lhe chamou Moedas Duarte.
Sala do Lagar de Azeite
Sala do pavilhão grande
Ao longe, o moinho do Cais das Faluas
Junto à janela, o primeiro tegão, de quatro.
tegão (...) Peça do moinho em forma de pirâmide invertida onde se deita o cereal para ser moído. Pl. tegãos. [Dicionário da Academia, ed. Verbo, 2001]
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